Evolution
Hoje na volta do meu trabalho, estava eu tranquilamente lendo meu livro no ônibus como de costume, quando um senhor alegando ser cego me pediu esmola. Isso também não é nada fora do normal, encontrar pessoas com deficiências físicas pedindo dinheiro. O anormal foi a minha reação.
Aquele senhor sujo, cheirando a bebida, cego, me pedindo dinheiro cortou meu coração. Não dei o dinheiro, eu realmente não tinha. Ele sentou ao meu lado, me pedindo licença e começou a falar coisas sem nexo. Minha primeira reação foi ignorar e continuar minha leitura. Mas falhei miseravelmente. Meu coração está mais mole do que de costume.
Tentei acompanhar o raciocínio de Daniel. Sim, ele é um ser humano e tem nome. Ele me dizia que ninguém o amava. Que a esposa o deixou falando que amava outro homem. Que não era um homem feliz e que tinha tudo e agora, de repente, não tem nada. E me disse “acho que eu vou chorar”. A única coisa que eu consegui responder foi “não chora, não”. E aí, com um sobressalto ele percebeu que eu o estava escutando, que ele realmente existia.
Perguntou meu nome e eu perguntei o dele. Todos me olhavam no ônibus e a minha vontade era mandar todos à merda. Ele disse que eu tinha voz de italiana [eba!] e me ensinou regras de etiquetas. Não consegui segurar o riso. E a pena.
Me despedi dele e segui meu caminho. Não consigo entender como nós seres humanos ainda somos animais tão primitivos. Temos que sempre perder o que temos para entender que aquilo que tínhamos era exatamente o que precisávamos e o que queríamos. E quando perdemos, corremos ansiosamente atrás daquilo que não existe mais. E me pergunto, até quando será assim?